Leitura de hoje


A leitura desta obra foi me sugerida por um professor numa aula do mestrado de Pintura que frequento. Estávamos perto da Feira do Livro em Lisboa, então esperei umas semanas e numa das visitas à Feira, que faço todos os anos com a minha irmã mais velha tornando-se quase já uma tradição, adquiri o livro. Comprei-o na Happy Hour do evento que me permitiu pagar metade do preço original, mas mesmo que assim não o fosse, valeria cada cêntimo. 
Já tinha lido algumas passagens na internet e desde logo percebi que abordava temas que me poriam a pensar e ajudariam a pensar no meu projeto artístico
Durante A Crítica da Razão Negra é nos apresentado um novo significado para a palavra Negro. Achille Mbembe fala-nos sobre as experiências históricas associadas à palavra. O domínio de uma raça face a outra que se impunha como superior, da escravatura imposta a milhares de seres humanos. Da utilização dos seus corpos e pensamentos transformando-os noutra coisa onde passavam a ser espectadores de qualquer coisa que já não era a sua própria vida. Mbembe faz uso da história para propor uma reflexão crítica sobre o mundo contemporâneo. Num paralelismo entre o escravo negro e a transformação dos seres humanos em coisas animadas, em dados digitais e em códigos apresenta-nos a ideia de devir-negro do mundo. Pela primeira vez na história humana, o nome Negro deixa de remeter unicamente para a condição atribuída aos genes de origem africana durante o capitalismo [...] A este novo carácter descartável e solúvel, à sua institucionalização enquanto padrão de vida e à sua generalização ao mundo inteiro, chamamos devir-negro do mundo. 
Esta nova classificação para a palavra Negro é associada ao humano cuja carne foi transformada em coisa e o espírito em mercadoria. Um homem que perdeu parte da identidade e criou uma forma abstrata para se adaptar a uma nova imagem de civilização. Toda a humanidade subalterna se tornou negra. Contudo, Mbembe fala da dualidade da palavra Negro e o símbolo em que ela se tornou ao longo da História, num desejo consciente de vida, força pujante e engajada no acto de criação. 
 O novo Homem depende do mercado e da dívida, tem de procurar ele mesmo um modo de sustento, reconfigurar-se em função do que a época lhe oferece ser empresário de si mesmo. Se anteriormente o problema era ser explorado pelo capital, agora a tragédia é já não poder ser explorado de todo. Esta é a condição a que estamos sujeitos, a uma validade curta e constante flexibilidade imposta pelo caráter descartável. Assumimos a qualidade de objeto dispensável numa sociedade supérflua que já nem é útil ao funcionamento do mercado. Já não há trabalhadores propriamente ditos. Já só existem nómadas do trabalho. Estamos perante uma objectificação do ser humano, sujeitos a uma conduta em função de normas do mercado, sem hesitar em se auto-instrumentalizar e instrumentalizar outros para optimizar a sua quota-parte de felicidade. 

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